
por Isabel Dall’Agnol
Já que gostas do meu sorriso, me dê motivos para sonhar, implorou ela.
Ele contou-lhe suas histórias e a incluiu em sua jornada.
Já que gostas dos meus olhos, me faça enxergar, suplicou ela.
Ele, gentilmente, retirou-lhes a venda que há muito os cobria.
Já que preciso de coragem, me dê a sua mão, pediu ela.
Ele a abraçou por inteiro.
Já que queremos voar, me carregue para longe, sugeriu ela.
Ele a aconchegou em suas asas, preparando-a, imediatamente, para partir.
Já que meu coração está partido, me ajude a curá-lo, desafiou ela.
Ele pousou suas mãos sobre o seu peito, enquanto a envolvia em seus braços.
Já que é assim que se faz nos tangos, me dê a sua parte, cochichou ela.
Ele deu-lhe o seu corpo.
Já que queres sentir o meu amor, me entregue o seu coração,
aconselhou ela, de olhos fechados.
Ele deu-lhe sua alma.
Então, ao abrir seus olhos, ela se deparou com uma imagem.
Franziu a testa, na tentativa de identificá-la.
Aquela mulher de preto estava mais velha, mais fria.
Em seu olhar vazio, transbordavam a tristeza, a melancolia, a saudade.
Não demorou muito e a reconheceu.
Porque, ainda assim, era ela.
Foi quando se deu por conta.
Estava diante de um espelho.
Sozinha.