
por Marcella Marx
O final é o começo invertido.
A palavra: r-o-m-a.
De tanto desuso, mal uso, uso em vão: caducou.
Não pode mais ser proferida. Emudeceu.
Cansada. Foi se deixando amolecer.
Palavra mole vai se desintegrando, perdendo a forma e a solidez. Virando isso e aquilo também. O que você quiser que seja, ela é.
Entristeceu primeiro, depois foi perdendo os cabelos, os dentes, a cor.
Ficou pálida, esquálida, franzina.
Escorreu qual geleia por um buraco de chão.
Todos estão a sua procura.
– Cadê ela? pergunta um daqueles por cuja boca ela saía todos os dias, com hora e local marcados.
– Ela quem? diz o distraído, um dos poucos por cuja boca ela jamais saiu.
– A palavra (). Ele tenta, seus lábios se abrem como se fosse em câmera lenta. Sua língua não o obedece. Ele balbucia consoantes e vogais que não formam nada parecido com ela.
A palavra derretida, parece entalada nos cantos da boca, mas não.
Já vai longe por entre o vão da terra que a acolhe.
Quem sabe ela hiberna em silêncio, repousa latente e volta.
Um dia.
Na boca de alguém que a sentir. Primeiro em osso, depois em músculo, pele e só derradeiro em som, pela boca. Expelida, não por escolha, mas por decisão de não sufocar.
Se assim for, palavra talvez volte, reinventada.
Até lá, aqui jaz a palavra a-m-o-r: enterrada.