
Como toda criança, Maria queria ser única. Quando a perguntavam com quem ela se parecia, Maria era enfática: “Com ninguém além de mim mesma”. Mas sozinha em seu quarto, Maria se observava e ia enxergando outras pessoas que não somente ela. Começava pelos seus pés. Seu maior dedo do pé esquerdo tinha uma semelhança terrível com o de seu tio, mais que isso, era ele. Maria passava horas observando-o e comparando-o com o do pé direito, este sim era ela, sem interferência. Maria pura. Depois, Maria subia para as mãos, mais especificamente, os dois polegares. Eram seu pai. Maria os escondia, abraçando-os com os outros dedos, estes sim, originais. Maria então ia até o espelho. Sua avó era o nariz. Seu avô as sobrancelhas. Maria perdia um tempo ali, irritada, em meio a pensamentos ranzinzas, absorta em sua resolução de ser somente ela mesma. Maria mais uma vez encara o espelho. Agora ela repara em sua boca, olhos, e orelhas, todos Maria e ninguém mais. Maria conclui então que era sim, Maria, em sua maior porção.